CONFLITO ENTRE O DIREITO DE PROPRIEDADE E OS DIREITOS DE VIZINHANÇA – LOCAÇÕES POR “AIRBNB” NA RELAÇÃO CONDOMINIAL RESIDENCIAL.
Ao comprar um imóvel o proprietário incorpora diversos direitos, protegidos pela legislação, como a
possibilidade de usar, de gozar, de dispor do bem e de reavê-lo do poder de quem injustamente o
possua ou detenha.
A propriedade, assim como qualquer outro direito, não é absoluta, devendo ser exercida em cotejo
com outras liberdades igualmente protegidas, bem como destinada a certa função social.
A globalização e o avanço das tecnologias digitais (revolução industrial 4.0) trouxeram diversos
entraves aos aplicadores do direito, ao considerar que grande parte da legislação não acompanhou
a evolução da sociedade. Nesse contexto surgiu um novo desafio: é possível restringir o direito dos
proprietários a locarem seus bens por temporada?
O aplicativo Airbnb apresentou uma nova forma para a locação de imóveis, antes comumente
adotada apenas por hotéis e motéis. Os proprietários passaram a ter ferramentas para o exercício
de um direito já existente, qual seja o de locar seus imóveis por curto período de tempo.
Todavia, mencionada ferramenta acabou por afetar outra sorte de direitos, inseridos em um
contexto de vizinhança, ao ser relevada a alta rotatividade de pessoas que passariam a circular em
condomínios residenciais (não necessariamente compromissados com o regimento interno ou
convenção). As críticas rodeavam questões como a segurança e bem-estar dos demais condôminos.
Como era de ser esperado, os conflitos chegaram ao Judiciário, na tentativa de ser restringido o
direito de propriedade e/ou regulamentada a locação via Airbnb. Recentemente chegou ao Superior
Tribunal de Justiça (STJ) uma demanda envolvendo a possibilidade de restrição pela convenção do
condomínio dessas locações, por meio do Recurso Especial nº 1819075/RJ.
Por maioria de votos, a Quarta Turma do STJ decidiu pela possibilidade de restrição do direito à
locação via plataformas digitais (como o Airbnb) caso a convenção do condomínio preveja
expressamente nesse sentido. Restou o entendimento de que as locações por Airbnb seriam
caracterizadas como contratos atípicos de hospedagem, não sendo contratos por temporada ou
semelhantes àqueles oferecidos por empreendimentos hoteleiros – que possuem regulamentações
próprias.
A perturbação à rotina do espaço residencial e a insegurança trazida aos demais condôminos foram
questões imprescindíveis para a formação do convencimento pelos Ministros. Todavia, no mesmo
acórdão ficou ressaltado que a locação via Airbnb seria uma atividade lícita, desde que harmonizada
com os limites à propriedade previstos na legislação.
O julgamento pela possibilidade de restrição das locações foi por maioria de votos, tendo sido
vencido o Ministro Luis Felipe Salomão (Relator). Para o Ministro, não haveria a possibilidade da
citada restrição, ao considerar que a modalidade de contrato não estaria inserida no conceito de
hospedagem, mas, sim, no de locação residencial por curta temporada e que o direito de propriedade seria indevidamente violado pelas convenções condominiais. Foi ressaltado que outras
medidas poderiam ser adotadas para minorar questões envolvendo segurança e vizinhança, como o
próprio cadastramento de pessoas na portaria.
Não há como negar que o assunto ainda será muito debatido nas instâncias superiores do Judiciário.
A decisão proferida no âmbito do Recurso Especial nº 1819075/RJ não possui efeito vinculante, mas
servirá certamente como norte para futuras jurisprudências.
A Equipe de Contratos do PLC Advogados coloca-se à disposição para quaisquer esclarecimentos e
providências que se fizerem necessários.
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