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DA INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA JULGAR O VÍNCULO DE EMPREGO EM RELAÇÕES COMERCIAIS.

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25 de janeiro de 2022

 

  1. INTRODUÇÃO

 

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em recente decisão, concluiu o julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade nº 48, entendendo que, uma vez preenchidos os requisitos da Lei nº. 11.442/2007 (transporte rodoviário de cargas), estará configurada relação comercial de natureza civil e afastada a configuração do vínculo de emprego.

 

Em decisão análoga, agora tratando acerca de demanda relacionada a representação comercial, o C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº. 606.003, especificamente quanto ao tema nº. 550 da repercussão geral, confirmou a exclusão da competência da Justiça do Trabalho para julgar o vínculo de emprego em casos de natureza comercial.

 

As aludidas decisões do Supremo Tribunal Federal consubstanciam substancial alteração da competência material da Justiça do Trabalho, sendo possível a aplicação analógica para outras categorias de profissionais liberais, como engenheiros, corretores e advogados.

 

  1. DA EXCLUSÃO DA COMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO NOS CASOS DE RELAÇÕES COMERCIAIS.

 

A Emenda Constitucional nº. 45 de 2004 ampliou consideravelmente a competência da Justiça Trabalhista para processar e julgar não apenas as ações derivadas da relação de emprego, como também as ações oriundas da relação de trabalho.

 

O artigo 114 da Constituição Federal, passou a vigorar nos seguintes termos:

 

Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

 

I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

 

II – as ações que envolvam exercício do direito de greve;

 

III – as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

 

IV – os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

 

V – os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

 

VI – as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

 

VII – as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

 

VIII – a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

 

IX – outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.

 

Dessa forma, a Justiça Especializada do Trabalho passou a julgar causas antes típicas da Justiça Comum, como ações de reintegração de posse que versassem indiretamente sobre a relação de trabalho, ações indenizatórias oriundas de acidente de trabalho e demandas sindicais.

 

A inclusão das discussões condizentes às relações de trabalho, ou seja, situações ou negócios jurídicos que não necessariamente tratem de relações celetistas de emprego, como também os vínculos jurídicos estipulados, expressa ou tacitamente, entre um trabalhador e uma pessoa física ou jurídica, que o remunera pelos serviços prestados.

 

Com isso, demandas de prestadores de serviços de toda ordem, por exemplo, pleiteando o vínculo de emprego e/ou verbas contratuais devidas, dentre outras, passaram a ser julgadas pela Justiça do Trabalho, com as prerrogativas do artigo 9º da CLT, in verbis:

 

Artigo. 9º – Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.

 

Ocorre que, recentemente, o Supremo Tribunal Federal, sem alterar os trechos da mencionada Emenda Constitucional, excluiu da competência da Justiça do Trabalho demandas tidas pelos Ministros como provenientes de relações comerciais e, não, de trabalho.

 

Conceitualmente, o contrato comercial é aquele praticado por sociedades empresárias ou pessoas naturais que estejam no exercício da sua profissão e, em que o objeto do contrato, é um ato de comércio. As relações comerciais mais praticadas são os de transporte, de mandato mercantil, de representação comercial, de gestão de negócio, de comissão, de mútuo mercantil, de seguro, de fiança mercantil, dentre outros.

 

Em suma, o contrato civil é aquele praticado por qualquer pessoa que seja capaz, conforme dispõe o Estatuto Civil, como casamento, aquisição de imóveis etc. Já o contrato comercial é diferente, pois resume-se naqueles praticados por comerciantes no exercício de sua profissão, cujo objeto é um ato do comércio.

 

Fato é que o C. Supremo Tribunal Federal adotou o posicionamento, confirmado pelo julgamento do RE 606.003, atribuindo à Justiça Comum a competência para processar e julgar as ações relacionadas a contratos de representação comercial formalizados com autônomos, e não a Justiça do Trabalho, por se tratar de profissão regulamentada por lei específica. Vejamos:

 

Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 550 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário, para assentar a competência da Justiça Comum, em razão de sua competência material para processar e julgar a causa, devendo o feito ser a ela remetido, nos termos do voto do Ministro Roberto Barroso, Redator para o acórdão, vencidos os Ministros Marco Aurélio (Relator), Edson Fachin e Rosa Weber. Foi fixada a seguinte tese: “Preenchidos os requisitos dispostos na Lei 4.886/65, compete à Justiça Comum o julgamento de processos envolvendo relação jurídica entre representante e representada comerciais, uma vez que não há relação de trabalho entre as partes”. Não participou deste julgamento, por motivo de licença médica, o Ministro Celso de Mello. Plenário, Sessão Virtual de 18.9.2020 a 25.9.2020. (STF; Plenário, RE 606.003 RIO GRANDE DO SUL, MIN.  MARCO AURÉLIO, Redator: MIN. ROBERTO BARROSO, publicado DJE 14/10/2020 – ATA Nº 173/2020. DJE nº 248, divulgado em 13/10/2020)

 

 

Não obstante, a ampliação do termo “empregado” na Constituição Federal trouxe uma equivocada percepção inicial para a expressão “relação de trabalho”, por certo muito mais abrangente que os limites da “relação de emprego” que, até então, sempre foi o cerne do direito material, expressão essa que mais tarde foi esclarecida pelo STF se tratar exclusivamente de relação de emprego.

 

Além disso, nos termos da NOTA TÉCNICA/CGRT/SRT/Nº 11/2006, “são profissionais liberais os que exercem suas atividades de forma autônoma, ou na qualidade de empregador, habilitados legalmente e com registro nos Conselhos Profissionais, após o atendimento dos requisitos técnicos e científicos previstos na legislação para o desempenho da profissão”.

 

Por esse novo entendimento do Supremo Tribunal Federal, a relação havida entre profissional liberal (habilitados legalmente e com registro nos Conselhos Profissionais) e tomador de serviços, através de Contrato de Prestação de Serviços, não mais possui natureza trabalhista passível de julgamento pela Justiça do Trabalho.

 

Imperioso destacar, ainda, o voto do Ministro Barroso em aludido julgamento do Supremo Tribunal Federal, que assim dispôs:

 

“Nesse contexto, na atividade de representação comercial autônoma inexiste entre as partes vínculo de emprego ou relação de trabalho, mas relação comercial regida por legislação especial, qual seja, a Lei n° 4.886 /65. Por conseguinte, a situação não foi afetada pelas alterações introduzidas pela EC n° 45/2004, que versa sobre hipótese distinta ao tratar da relação de trabalho no art. 114 da Constituição”.

 

Recentemente, a Suprema Corte, no julgamento da Reclamação 46356 RS, de relatoria da Min. Cármen Lúcia, amparada em seus próprios precedentes, ratificou o entendimento de que os profissionais regidos por legislação específica devem ter a relação contratual analisada e julgada pela Justiça Comum, não sendo competência desta Especializada o processamento de ações de tal natureza, conforme a seguir:

 

DECISÃO RECLAMAÇÃO. ALEGADO DESCUMPRIMENTO DA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE N. 48. COMPROVAÇÃO. PRECEDENTES. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE. Relatório 1. Reclamação, com requerimento de medida liminar, ajuizada por Avilan Transportes e Logística Ltda. – Epp, em 17.3.2021, contra a seguinte decisão, proferida em 3.3.2021 pela Vara do Trabalho de Guaíba na Reclamação Trabalhista n. 0021547-86.2017.5.04.0221, pela qual se teria desrespeitado o decidido por este Supremo Tribunal na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 48: “Indefiro o pedido da ré, requerendo o reconhecimento da incompetência da Justiça do Trabalho para analisar a matéria em questão na presente ação, uma vez que a análise para verificar se o reclamante é autônomo ou sob o regime celetista é da JT” (e-doc. 11). 2. A reclamante alega que, na contestação, “foram anexados o cadastro realizado como Prestação de Serviços de Transporte de Cargas – Autônomo, com amparo na Lei 11.442/2007, pelo fato que o motorista – autor da referida reclamatória – atua com caminhão próprio e é devidamente inscrito na ANTT, claramente caracterizado como Transportador Autônomo de Cargas – TAC (anexa contestação)” (fl. 3, e-doc. 1). Assinala que o processo teria sido sobrestado e, após o “julgamento da ADC 48/DF, os autos retornaram à tramitação com designação de audiência de conciliação”, tendo “a ora Reclamante (…) requer[ido] o reconhecimento da incompetência da Justiça do Trabalho com subsídio também na decisão da Reclamação 43.982/ES” (fl. 3, e-doc. 1). Ressalta que, em 3.3.2020, a “Juíza do Trabalho Substituta, Bruna Gusso Baggio, proferiu o despacho [indeferindo o pedido de reconhecimento de incompetência material e] manteve designada audiência de instrução e julgamento para 22.09.2021 às 10h45” (fl. 3, e-doc. 1). Sustenta que “cabe à Justiça Comum a análise e discussão acerca do preenchimento dos pressupostos e requisitos da Lei 11.442/2007” (fl. 6, e-doc. 1). Requer medida liminar “para cassar o r. despacho proferido nos autos nº 0021547-86.2017.5.04.0221 na data de 03.03.2021, determinado à Vara do Trabalho de Guaíba/RS a integral observância da decisão de mérito da ADC 48 e, consequentemente, o encaminhamento dos autos à Justiça Comum e o reconhecimento de relação comercial de natureza civil entre as partes dos autos nº 0021547- 86.2017.5.04.0221” (fl. 9, e-doc. 1). No mérito, pede a procedência da presente reclamação para cassar a decisão reclamada e determinar a remessa do processo à Justiça comum. Examinados os elementos havidos nos autos, DECIDO. 3. Põe-se em foco nesta reclamação se, ao afirmar a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a demanda, a autoridade reclamada teria desrespeitado o decidido por este Supremo Tribunal na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 48. 4. O cabimento de reclamação pressupõe seja a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal anterior à decisão reclamada. Na espécie em exame, a decisão reclamada foi proferida pelo juízo da Vara do Trabalho de Guaíba na Reclamação Trabalhista n. 0021547-86.2017.5.04.0221 em 3.3.2021, após o julgamento por este Supremo Tribunal da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 48. 5. Em 15.4.2020, no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 48, Relator o Ministro Roberto Barroso, o Supremo Tribunal Federal decidiu: “DIREITO DO TRABALHO. AÇÃO DECLARATÓRIA DA CONSTITUCIONALIDADE E AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS. LEI 11.442/2007, QUE PREVIU A TERCEIRIZAÇÃO DA ATIVIDADE-FIM. VÍNCULO MERAMENTE COMERCIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO DE RELAÇÃO DE EMPREGO. 1. A Lei nº 11.442/2007 (i) regulamentou a contratação de transportadores autônomos de carga por proprietários de carga e por empresas transportadoras de carga; (ii) autorizou a terceirização da atividade-fim pelas empresas transportadoras; e (iii) afastou a configuração de vínculo de emprego nessa hipótese. 2. É legítima a terceirização das atividades-fim de uma empresa. Como já foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição não impõe uma única forma de estruturar a produção. Ao contrário, o princípio constitucional da livre iniciativa garante aos agentes econômicos liberdade para eleger suas estratégias empresariais dentro do marco vigente (CF/1988, art. 170). A proteção constitucional ao trabalho não impõe que toda e qualquer prestação remunerada de serviços configure relação de emprego (CF/1988, art. 7º). Precedente: ADPF 524, Rel. Min. Luís Roberto Barroso. 3. Não há inconstitucionalidade no prazo prescricional de 1 (um) ano, a contar da ciência do dano, para a propositura de ação de reparação de danos, prevista no art. 18 da Lei 11.442/2007, à luz do art. 7º, XXIX, CF, uma vez que não se trata de relação de trabalho, mas de relação comercial. 4. Procedência da ação declaratória da constitucionalidade e improcedência da ação direta de inconstitucionalidade. Tese: “1 – A Lei 11.442/2007 é constitucional, uma vez que a Constituição não veda a terceirização, de atividade-meio ou fim. 2 – O prazo prescricional estabelecido no art. 18 da Lei 11.442/2007 é válido porque não se trata de créditos resultantes de relação de trabalho, mas de relação comercial, não incidindo na hipótese o art. 7º, XXIX, CF. 3 – Uma vez preenchidos os requisitos dispostos na Lei nº 11.442/2007, estará configurada a relação comercial de natureza civil e afastada a configuração de vínculo trabalhista” (DJe 16.4.2020). Na espécie, ao se concluir pela competência da Justiça do Trabalho para decidir sobre a existência de vínculo empregatício da sociedade empresária transportadora com transportador autônomo de cargas, descumpriu-se o decidido no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 48. Ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal têm decidido neste sentido: “CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA RECLAMAÇÃO. VIOLAÇÃO AO QUE DECIDIDO NA ADC 48. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM PARA JULGAR CAUSA ENVOLVENDO RELAÇÃO JURÍDICA COMERCIAL. AGRAVO INTERNO PROVIDO. 1. No julgamento da ADC 48, o Ministro Relator Roberto Barroso consignou em seu voto que a Lei 11.442/2007, “disciplina, entre outras questões, a relação comercial, de natureza civil, existente entre os agentes do setor, permitindo a contratação de autônomos para a realização do Transporte Rodoviário de Cargas (TRC) sem a configuração de vínculo de emprego”. 2. As relações envolvendo a incidência da Lei 11.442/2007 possuem natureza jurídica comercial, motivo pelo qual devem ser analisadas pela justiça comum, e não pela justiça do trabalho, ainda que em discussão alegação de fraude à legislação trabalhista, consubstanciada no teor dos arts. 2º e 3º da CLT. 3. Agravo Interno provido” (Rcl n. 43.544-AgR, Relatora a Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 3.3.2021). “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA RECLAMAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. ART. 1.024, § 3º, DO CPC/2015. ATO RECLAMADO QUE VIOLA A SÚMULA VINCULANTE 10 E O JULGADO NA ADC 48/DF. SUBSISTÊNCIA DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – As razões do agravo regimental são inaptas para desconstituir os fundamentos da decisão agravada, que, por isso, se mantêm hígidos. II – O acórdão reclamado afastou a aplicação dos arts. 2º, 4º e 5º da Lei 11.442/2007, no que diz respeito à impossibilidade de formação de vínculo empregatício entre o transportador autônomo e a empresa de transporte rodoviário de cargas, o que caracteriza, no caso, evidente desrespeito ao enunciado da Súmula Vinculante 10 e ao julgamento da ADC 48/DF, de relatoria do Ministro Roberto Barroso. III- Agravo regimental a que se nega provimento” (Rcl n. 27.138-ED, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe 4.11.2020). Confiram-se também, por exemplo, as decisões monocráticas proferidas na Reclamação n. 46.069, Relator o Ministro Alexandre de Moraes, DJe 4.3.2021, e na Reclamação n. 43.982, Relator o Ministro Roberto Barroso, DJe 2.3.2021. 6. Pelo exposto, julgo procedente a presente reclamação para cassar a decisão proferida pela Vara do Trabalho de Guaíba na Reclamação Trabalhista n. 0021547-86.2017.5.04.0221 e determinar a remessa dos autos daquele processo à Justiça comum. Publique-se. Brasília, 19 de março de 2021. Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora. (STF – Rcl: 46356 RS, Relator: CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 19/03/2021, Data de Publicação: 23/03/2021) (destaques nossos)

 

As referidas decisões não são erga omines, não são ex tunc e não possuem efeitos regulatórios para os demais casos do gênero.

 

Não há como afastar a aplicação analógica de ambos julgados do Supremo Tribunal Federal aos demais casos que versem sobre relações comerciais mantidas entre profissionais liberais regulados por legislação e conselhos próprios, na forma da NOTA TÉCNICA/CGRT/SRT/Nº 11/2006.

 

Fato é que as ações de engenheiros, advogados, corretores imobiliários, dentre outros, passariam a ser julgados pela Justiça Comum, ante a mera adoção dos mesmos argumentos da mencionada decisão do Supremo Tribunal Federal.

 

Neste contexto, há que se transcrever um notável trecho da decisão supracitada, de relatoria da Min. Cármen Lúcia:

 

“2. As relações envolvendo a incidência da Lei 11.442/2007 possuem natureza jurídica comercial, motivo pelo qual devem ser analisadas pela justiça comum, e não pela justiça do trabalho, ainda que em discussão alegação de fraude à legislação trabalhista, consubstanciada no teor dos arts. 2º e 3º da CLT. 3.” (STF – Rcl: 46356 RS, Relator: CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 19/03/2021, Data de Publicação: 23/03/2021)

 

Ante a inexistência de regulação pelo Supremo Tribunal Federal, caberia às partes demanddaas perante a Justiça do Trabalho, alegar a mencionada incompetência material caso haja a discussão supra, para fins de encaminhamento e julgamento.

 

A manutenção da competência da Justiça do Trabalho em casos de profissionais liberais, que tenham com os seus tomadores de serviços relações comerciais, pode provocar grave falta de isonomia nas decisões judiciais, além de decisões passíveis de nulidade por possível decisão de caráter geral do Supremo Tribunal Federal.

 

Por sua vez, em nosso entender, caberia ao Supremo Tribunal Federal, em caráter de urgência, já regular a tramitação de ações congêneres ainda normalmente distribuídas e julgadas perante a Justiça do Trabalho, sob pena de adotar-se para casos juridicamente semelhantes análises e competências diversas.

 

O procedimento submetido ao conceito material do trabalho não possui as mesmas prerrogativas, princípios e normas do processo que tramite civilmente, o que pode ensejar, além da falta de isonomia, ofensas aos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal e da legalidade.

 

A relação entre um profissional liberal autônomo, cuja atividade possui uma legislação própria, regulada por contrato firmado com base na relação comercial havida entre as partes, de fato, merece ser julgado pelo jurisdicionado atrelado a natureza de sua relação, ou seja, de âmbito cível.

 

Ao analisar a relação cível, legalmente regulada, a Justiça do Trabalho, por vezes, utiliza de premissas e conceitos celetistas, revogando tacitamente trechos legais cumpridos em estrito senso pelas partes contratuais.

 

A nulidade geral concedida ao judiciário trabalhista, via artigo nono da CLT, traz para as partes contratantes enorme insegurança jurídica, eis que a natureza da demanda é alterada desde a competência material outrora inequívoca da Justiça do Trabalho.

 

Por óbvio, caso a relação cível seja desvirtuada, ou seja, nula por vícios de fato ou de direito, caberá ao judiciário cível a denúncia compatível e remessa para a Justiça Especializada do Trabalho, conforme sinalizado pelo próprio Supremo Tribunal Federal.

 

Em que se pese o desacerto quanto a falta de regulação e ausência de decisão erga omines, inclusive para todos os casos congêneres, as aludidas decisões do Supremo Tribunal Federal nos parecem acertadas no momento que corrigem e limitam a competência da Justiça do Trabalho majorada pela Emenda Constitucional nº. 45/2004.

 

  1. CONCLUSÃO

 

O Supremo Tribunal Federal, por meios de recentes decisões, alterou substancialmente a competência material da Justiça do Trabalho para casos específicos de representantes comerciais e transportadores, declarando que em casos de comprovada relação comercial, a Emenda Constitucional nº 45 de 2004 não se aplica e, por isso, caberia a Justiça Comum o julgamento de tais ações.

 

A fundamentação jurídica aplicada pelo Supremo Tribunal Federal pode ser analogicamente aplicada para outras categorias de profissionais liberais que mantenham efetivas relações comerciais via contrato de prestação de serviços, como engenheiros, corretores e advogados.

 

A ausência de regulação da matéria e/ou análise erga omines, inclusive para casos congêneres, pelo Supremo Tribunal Federal, pode provocar graves ofensas aos princípios constitucionais da isonomia, devido processo legal e legalidade.

 

Outrossim, em que se pese o desacerto quanto a falta de regulação e ausência de decisão erga omines, inclusive para todos os casos congêneres, as aludidas decisões do Supremo Tribunal Federal nos parecem acertadas no momento que corrigem e limitam a competência da Justiça do Trabalho majorada pela Emenda Constitucional nº. 45/2004.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Promulgada em 05 de outubro de 1988.

 

BRASIL. ‘Consolidação das Leis do Trabalho’ – em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm – 12/03/2018.

 

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002.

 

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 15. ed. São Paulo: LTr, 2016.

 

Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº. 46356. Relatora Ministra Cármen Lúcia. Publicado em 23.03.2021.

 

Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº. 606003. Relator Ministro Marco Aurélio. Publicado em 13.10.2020.

 

Paula. Alexandre Sturion. Noções de Contrato Comercial. Disponível em: https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1121/Singela-nocao-dos-contratos-mercantis. Acesso em 20 set. 2021.

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